OS 7 ERROS DE ‘EM FAMÍLIA’

O sucesso, já foi dito um milhão de vezes, é algo imponderável. Mas no mundo das novelas – pode-se considerar que infelizmente – há uma meia dúzia de itens que, usados com certa habilidade, são capazes de atrair audiência.Três ingredientes são óbvios e, não por acaso, estão sempre presentes nas novelas de Walcyr Carrasco, autor que coleciona pontos no Ibope: barraco, bordão e humor popularesco. No caso da novela das nove, o horário permite ainda que se recorra a um tanto de sexo e nudez calculada, o suficiente para instigar os instigáveis sem afugentar os mais pudicos. Um vilão para o público amar odiar também ajuda – e muito, basta lembrar dos saudosos Félix (Mateus Solano) e Carminha (Adriana Esteves). Heróis para torcer são uma espécie de sonho de consumo dos autores, mas difíceis de construir, já que nem sempre os bons conseguem a simpatia da plateia – como conseguiu o Tufão (Murilo Benício) de Avenida Brasil (2012).
Nesse contexto, o noveleiro atento pode se questionar: “Mas e a história?”

Pois é. A história, que deveria ser a espinha dorsal de uma novela, parece ter ficado em segundo plano. Ou, numa visão mais otimista, tornou-se algo que corre como pano de fundo ao mesmo tempo em que se tenta acordar a audiência com cenas de efeito, em geral, com personagens rolando no chão – brigando ou fazendo sexo.
Por essas e outras, Em Família (Globo, 21h15) não tem conseguido deslanchar. Manoel Carlos se propôs contar uma história que é, sim, boa, mas simples, cotidiana. Veja os sete “erros” que podem ter afastado o público da novela – entre aspas porque a baixa audiência não significa que a novela é ruim, apenas que não tem as iscas que ajudaram a fisgar o público nas últimas produções da emissora::
1. A mimada e o arrogante
Sem amores idealizados, a novela se concentra no romance entre a jovem Luiza (Bruna Marquezine) e o quarentão Laerte (Gabriel Braga Nunes). É, de fato, um namoro que poderia acontecer na vida real. Mas uma é mimada e o outro, arrogante. Os dois são mentirosos. É, portanto, um casal fadado  à rejeição. O problema é que sem o envolvimento dos dois personagens, a novela não acontece – o que pôs o autor numa armadilha.
Clara (Giovanna Antonelli) sentirá ciúme de Marina (Tainá Müller): para boa parte do público, vale mais a família que a personagem tem com o _ fofíssimo – Cadu de Reynaldo Gianecchini (Divulgação)

Clara (Giovanna Antonelli) sentirá ciúme de Marina (Tainá Müller): para boa parte do público, vale mais a família que a personagem tem com o – fofíssimo e fragilizado – Cadu de Reynaldo Gianecchini (Divulgação)
2. Clarina
A trama de Clara (Giovanna Antonelli) e Marina (Tainá Müller) é forte. A história de uma dona de casa capaz de abandonar marido e filho pequeno por causa de outra mulher é, sem dúvida, capaz de criar polêmica. Mas do jeito que foi apresentado, o romance ficou no campo da atração, do encantamento. Clara é homossexual ou está apenas encantada pela vida charmosa da nova amiga? É o que os telespectadores não estão tendo paciência de esperar para descobrir. Fora isso, Clara tem contra si a figura doce de Reynaldo Gianecchini, que vive o marido Cadu, à beira de um transplante de coração. Como abrir mão dele por uma pessoa que, já foi dito em cena, tem fama de volúvel? O coração é traiçoeiro, é verdade. Mas em vez de torcer pelo amor e redenção, como foi no caso de Félix e Niko Carneirinho (Thiago Fragoso) em Amor à Vida, não será surpresa se o público optar pela manutenção da família.
3. Estupro
É louvável que a novela tenha personagens bastante reais, que reajam como seres humanos reagiriam – ou seja, errando. Mesmo assim, fica difícil assistir, por exemplo, a Alice (Erika Januza) seguir na busca pelo pai desconhecido, mesmo após descobrir que estuprou sua mãe. Faltou à moça, aliás, a sensibilidade de um afago na pobre Neidinha (Elina de Souza), massacrada durante 20 anos pela violência que sofreu.
4. Minha mãe é uma sereia
O descompasso entre as idades de algumas atrizes e suas personagens gerou uma certa má vontade com a novela logo de cara. Os envolvidos na produção pensaram que a sensação de que algo está errado seria diluída com o tempo e as boas interpretações, mas que nada. Ainda que o público deixe de lado o absurdo que é Natália do Vale (Chica) ser mãe de Júlia Lemmertz (Helena), continua sendo muito estranho imaginar que Ana Beatriz Nogueira, a Selma, está perdendo a memória e pode parar num asilo.
5. Fala sério, vó!
Há humor na novela, mas não capaz de provocar risadas na maior parte da plateia. O núcleo do asilo é engraçado e poético, apesar do exagero no temperamento arrogante de Miss Lauren (Betty Gofman). Mas talvez seja preciso ter algumas décadas de estrada para achar graça em piadas que envolvem reumatismo e paquera na terceira idade.
Shirley (Vivianne Pasmanter), a vilã gente fina: "Cobra, eu?"

Shirley (Vivianne Pasmanter), a vilã gente fina: “Cobra, eu?”
6. Loira – só um pouco – má
Ainda que não se queira recorrer ao velho maniqueísmo, a novela precisa de uma figura, digamos, de energia ruim, capaz de movimentar a trama. Shriley (Vivianne Pasmanter) é ótima personagem, mas não serve como vilã – solar, divertida e mais sincera do que os mocinhos, até caridade ela faz! E Branca (Ângela Vieira) não merece um posto de vilania – é apenas a “ex desesperada digna de pena”, chata demais.
7. Oi, oi, oi
As novelas de Manoel Carlos são famosas pela trilha sonora de bom gosto. Mas nos primeiros meses – situação que vem sendo corrigida nos últimos capítulos – só se ouvia com destaque a faixa Só Vejo Você, na voz de Tânia Mara. Música, como o insuportável mas funcional “Oi, Oi, Oi” de Avenida Brasil demonstrou, é essencial para fazer uma novela “colar” no cotidiano dos telespectadores.